Ajudar não é impor. É amparar substancialmente, sem pruridos de personalismo, para que o beneficiado cresça, se ilumine e seja feliz por si mesmo.
André Luiz
Paulo de Tarso nos fala do amor de forma sublime na primeira carta aos coríntios. No referido texto, o amor é apresentado como um posicionamento ativo em relação ao outro que elimina as prerrogativas pessoais em favor daquele a quem nos direcionamos. Este posicionamento ativo, traduzido por alguns como caridade ou amor em movimento, parece ser o cerne da idéia trazida por André Luiz na citação estudada.
Abrir mão dos personalismos e agir em relação ao outro de forma a permitir-lhe que se construa e seja feliz é uma das máximas propostas pela doutrina espírita e talvez seja a maior exemplificação de respeito ao livre-arbítrio, a liberdade a que todos nós temos acesso como ferramenta de aprendizado a cerca de nós mesmos, do outro e de Deus.
Neste sentido, torna-se imperioso questionarmos por que ajudamos. Reconhecer as fraquezas e deficiências de nossos pares e as nossas próprias é um passo muito importante para que nossas relações com a sociedade possam ser mais saudáveis.
Nutrirmos sentimentos fraternos e solidários por aqueles que possuem fraquezas é parte de nosso processo de reconhecimento do outro e passo precioso no reconhecimento de nós mesmos como filhos de Deus, como nos sugere Jesus ao enaltecer o ensinamento de amor a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo como sendo o resumo de toda a lei divina.
André Luiz nos sugere, entretanto, que é importante refletirmos sobre a forma como temos ajudado ao outro. É necessário que, além de reconhecermo-nos em nossas fraquezas e de mobilizarmo-nos em ações de apoio mútuo, reflitamos sobre o objetivo a ser atingido por cada um de nós individual e coletivamente através das vivências às quais estamos submetidos.
O livro dos Espíritos e O Evangelho Segundo o Espiritismo, obras de Allan Kardec, nos ensinam que todos nós somos espíritos imortais destinados à felicidade e que contamos com o apoio das encarnações, mergulhos em ambientes especializados de aprendizado, para desenvolvermos o conhecimento a cerca de nós mesmos e de nosso papel na criação.
Desta forma, ajudar ao outro não se caracteriza apenas como uma ação de apoio material, o que está em jogo é a ampliação da capacidade do outro de agir segundo seu próprio juízo, responsabilizando-se por seus próprios pensamentos, sentimentos e atos segundo a ótica espiritual; e só conseguimos agir desta forma no momento em que nos descobrimos como espíritos imortais, criaturas de uma potência soberanamente boa e justa que nos destina a atingir a felicidade através de nossos próprios esforços. Este movimento de descoberta é que nos leva a desabrochar o potencial que existe em nós e nos liberta para sermos autênticos em nossas intervenções no universo, assumindo assim a premissa proposta de que somos Deuses (“Vós sois deuses”, “Eu e o Pai somo um”; Jesus).
Apoiar aquele que, como nós, se encontra em processo de ampliação das capacidades espirituais também não pode ser visto como a conformação do outro aos nossos modelos de crenças e valores, até porque estes também estão sujeitos a ajustes por serem fruto de visões parciais que construímos do mundo a partir do que já conseguimos perceber.
Agir de forma caridosa, do latim caritas (amor), de carus (caro, de alto valor, digno de apreço, de amor), torna-se, desta forma, agir cuidadosamente para que o outro possa desabrochar, despertar suas potencialidades e desenvolvê-las ao máximo segundo a verdade divina e não segundo a nossa verdade, ainda tão chamuscada pelas imperfeições e pela miopia espiritual característica de nosso estágio evolutivo.
O próprio Cristo nos ensina que é necessário que batamos às portas para que elas se abram. Não é possível que evoluamos pelo outro. O processo de desenvolvimento das potencialidades espirituais é individual, embora ocorra simultaneamente com todos os espíritos para que possamos usufruir, através da convivência em sociedade, dos benefícios de estarmos juntos podendo trocar conhecimentos e nos apoiando mutuamente nas questões em que temos dificuldades.
Ser caridoso, ajudar, amparar, socorrer, é dar recursos de forma ampla para que o outro possa perceber-se em suas limitações, sentir-se amparado na jornada de crescimento e fortalecido a continuar tentando, apesar das dificuldades encontradas.
É necessário fazermos nossas próprias perguntas para que, através da busca das respostas, sejamos capazes de apreender a realidade espiritual, de reconhecermos nossos limites e de agirmos conscientemente.
É sábio buscarmos nossas próprias respostas através das respostas oferecidas pelos companheiros que estão à nossa volta, mas é muito importante que a descoberta seja nossa. Só assim conseguiremos atingir o estágio de alteridade ao qual estamos destinados e do qual a nossa felicidade depende.
Devemos, desta forma, buscar respeitar sempre o momento de cada um. Precisamos ajudar, apoiar, amparar, mas não substituir a capacidade de discernimento do outro. Por esta ótica, a caridade assume um caráter de combate às nossas manifestações de orgulho e egoísmo, caracterizando-se como saudável medicamento e catalisador de nossa própria transformação.
Referências
- Referências
- Kardec, Allan; O evangelho segundo o espiritismo.
- Kardec, Allan; O livro dos espíritos.
- Kardec, Allan; O céu e o inferno.
- Denis, Léon; O grande enigma.
- Denis, Léon; O problema do ser do destino e da dor.
- Caridade: amor em ação; Redação do Momento Espírita; http://www.momento.com.br/pt/ler_texto.php?id=1633&let=&stat=0
- Gregório, Sérgio Biagi; Caridade; http://www.sergiobiagigregorio.com.br/palestra/caridade.htm
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Este artigo faz parte do projeto Reflexão Diária que iniciou-se em 05/01/2011 a partir de um presente que ganhei em 2010, uma caixinha cheia de citações (veja o artigo "O importante não é a etiqueta" para mais detalhes)
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