(...)Extraído do livro ”CONVIVER PARA AMAR E SERVIR”; baseado em Mário da Costa Barbosa; organização: Helder Boska de Moraes Sarmento, Reinaldo Nobre Pontes e Sonia Regina Hierro Prolin; editado pela Federação Espírita Brasileira – FEB; do Capítulo 23; da pág. 54 até 57.
Então aproximou-se dele um mancebo e disse: “Bom mestre, que bem devo fazer para adquirir a vida eterna?” (...) “Se queres entrar na vida, guarda os mandamentos”. “Que mandamentos?”, retrucou o mancebo. Disse Jesus: “Não matarás; não cometerás adultério; não furtarás; não darás testemunho falso. Honra a teu pai e a tua mãe e ama a teu próximo como a ti mesmo”. O moço lhe replicou: “Tenho guardado todos esses mandamentos desde que cheguei à mocidade. Que é o que ainda me falta?” Disse Jesus “Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me”. Ouvindo essas palavras, o moço se foi todo tristonho, porque possuía grandes haveres” (Mateus, 19:16 a 24).
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A busca do significado da vida, traduzida na pergunta do Mancebo Rico: “Que farei de bom para adquirir a vida eterna?” não pode corresponder ao isolamento. Àquele jovem faltava o testemunho do compartilhamento do seu tesouro, sem o que o significado da vida seguiria, para ele, sendo um mistério. Esse significado não se entrevê somente com informação, e, sim numa ação com outra pessoa. Os homens se dão a conhecer não pelo discurso, mas pela vida. O significado da vida de Gandhi é conhecido pelo discurso ou pela vida? Os evangelhos são “a vida de um homem através de outras vidas” (Amélia Rodrigues), logo, resulta de uma ação transformadora, educativa, compartilhada no mundo com outros semelhantes.
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Segui refletindo
"Àquele jovem faltava o testemunho do compartilhamento do seu tesouro, sem o que o significado da vida seguiria, para ele, sendo um mistério. Esse significado não se entreve somente com informação, e, sim numa ação com outra pessoa"
Remete-me à lei de sociedade em toda a sua profundidade, levando-nos a partilhar de nossos tesouros como único caminho para a evolução.
Instigante neste movimento de partilha é que, à medida em que fazemos este mergulho, percebemos que nosso tesouro ainda é pequenino e a nossa percepção sobre a realidade da vida é ainda um diamante a ser lapidado. Vamos nos descobrindo no curso da convivência e percebendo a enormidade de valores a serem ainda melhorados e um infindável volume de hábitos a serem transformados sem que seja necessário que alguém aponte para nós o dedo realizando um diagnóstico, ação tão comum em um planeta de provas e expiações em que o julgamento e o preconceito fazem-se tão presentes. Nos tornamos responsáveis pelo nosso próprio caminho! Livre arbítrio puro...
Quando Mario Barbosa propõe sabiamente o convite a caminhar com o outro, ele não aponta para o indivíduo indicando que ele possui ainda muitos defeitos e que, portanto, precisa melhorar muito. Ele convoca a pessoa a oferecer seus tesouros aos que acreditamos ter menos do que nós. Uma ação de profundo respeito à auto-imagem que fazemos de nós mesmos. Ação de profundo respeito pela individualidade constituída. Lembrando Ghandi, o autêntico Namastê (O Deus que reside em mim saúda o Deus que reside em você). Talvez a maior prática de não violência a que sejamos convocados na sociedade atual.
Esta postura recorda-me a pedagogia do amor, proposta de forma prática por Pestalozzi e Russeau, bases da formação de Kardec, assim como o método Franciscano. Ambos menos preocupados em formalizar um método de trabalho e avidamente empenhados em estabelecer espaços seguros de convivência através dos quais o sujeito desperta para a vida; acreditavam que cada vivência única e irreproduzível atende unicamente ao grupamento envolvido nela e que o processo de educação não se caracteriza por "instalar" conhecimentos no sujeito, mas em proporcionar a reflexão e o desabrochar natural dos potenciais trazidos por cada sujeito.
Temos diversos estudiosos que seguem esta linha mais construtivista, citaria ainda Lev Vygotsky, Huberto Hoden, Eurípides Barsanulfo e Madre Tereza de Caucutá.
É o espaço de convivência proposto por Mário Barbosa, uma reprodução do que acontecia em Yverdon, nos acampamentos de Ghandi e, em última análise, nos grupos de convivência que se formavam em torno de Jesus há dois mil anos atrás.
Ainda ontem postei no Facebook uma citação atribuída a José Saramago, "Aprendi a não tentar convencer ninguém. O trabalho de convencer é uma falta de respeito. É uma tentativa de colonização do outro", que me levou diretamente a este assunto. Eu refletia sobre a dor que é termos nossa individualidade desconstruída pelo outro, agressor externo que desvaloriza e desqualifica nossos potenciais e aponta os caminhos que devemos trilhar, talvez num ato desesperado de significar-se e afirmar-se.
Acredito que vivemos uma grave crise de auto-estima na sociedade; crise que está nos congelando e dificultando nossa caminhada rumo à felicidade espiritual que se fará por iniciativa nossa e através do espírito corajoso e empreendedor que necessita ser fortalecido em nós.
Esta crise, fruto de nossos erros, do cansaço de tantas quedas, mas também de ações sistemáticas que nos desqualifica e massacra, precisa receber atenção urgente por parte das pessoas que assumem as bandeiras da educação em todos os graus (formal e informal).
Temos crianças e jovens apáticos, massacrados por um modelo que não as atende nas escolas e que lhes impõe um modus vivendi incompatível com suas percepções sobre a vida, evasão dos núcleos religiosos de educação, evasão na família e um intenso fluxo de pessoas mascaradas a manifestarem-se nas redes sociais apresentando vidas que são apenas flores, e a prostrarem-se em frente às televisões sem se relacionarem com o mundo; talvez em uma tentativa desesperada de serem aceitas na "sociedade ideal", ou de sofrerem menos ao reduzirem os contatos externos e reais com a vida.
Vemos a depressão fluindo em nossas sociedades juntamente com grande volume de criaturas frustradas e aumentos nas taxas de suicídio, talvez em uma tentativa desesperada de negação e fuga da realidade contundente.
Por outro lado, também atendendo de certa forma ao instinto de conservação, vemos centenas de espíritos insatisfeitos e agressivos a impetrarem ações nocivas ao modelo vigente, talvez em uma tentativa desesperada de afirmarem seus espaços na sociedade e de não serem engolidos por um sistema que consome suas vidas.
Podemos, e devemos, ver todo este massacre também com o grau de utilidade a que se destina, uma vez que é este movimento que faz repensarmos nossas atitudes orgulhosas e egóicas levando-nos a posturas mais humildes e submissas com relação às forças externas a nós e, em última análise, a Deus.
Mas é importante pensarmos que se o escândalo é necessário, ai daquele por quem venha; ou seja, se toda dor causada é importante para aquele que a sente, há compromisso negativo perante a lei para aquele que o causa.
Neste sentido do compromisso, olhando sobre o aspecto de sermos caridosos e fontes de renovação para a sociedade e para nós mesmos sem adquirirmos compromisso negativo perante a lei de Deus, é que acolho este discurso da constituição de espaços de convivência através dos quais respeitosamente elaboramos em conjunto os conteúdos que melhor atendem aos grupos envolvidos nas atividades a que nos propomos.
Repensar a evangelização espírita para crianças e jovens como um espaço coletivo e democrático de elaboração de valores humanos para os envolvidos, crianças, jovens, evangelizadores e famílias é, a meu ver, um dever em todos os núcleos espíritas. Deve ser prioridade dos dirigentes das casas e meta palpável para os coordenadores de atividades e evangelizadores.
Estabelecer canais de diálogo com a família e com a sociedade, discutir programas de aula e metodologias aplicados são ações urgentes a meu ver. Precisamos agir de forma ainda mais caridosa e respeitosa em nossos círculos de convivência com vistas a criar espaços através dos quais o sujeito se sinta mais responsável por si próprio e seja capaz de tornar-se corajoso e empreendedor assumindo assim, com mais coerência, o seu dever moral, conforme proposto em O Evangelho Segundo o Espiritismo, obrigação assumida entre ele e Deus e que se aplica na convivência em sociedade através da prática de direitos que não invade o direito alheio.
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